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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

322. Coro dos Empregados da Câmara

por Manuel da Fonseca

É tão vazia a nossa vida, é tão inútil a nossa vida
que a gente veste de escuro como se andasse de luto.
Ao menos se alguém morresse e esse alguém fosse um de nós
e esse um de nós fosse eu...
... O Sol andando lá fora, fazendo lume nos vidros,
chegando carros ao largo com gente que vem de fora
(quem será que vem de fora?)
e a gente praqui fechados na penumbra das paredes,
curvados prás secretárias fazendo letra bonita.
Fazendo letra bonita e o vento andando lá fora
rumorejando nas árvores, levando nuvens pelo céu,
trazendo um grito da rua (quem seria que gritou?)
e a gente praqui fechados na penumbra das paredes,
curvados prás secretárias fazendo letra bonita,
enchendo impressos, impressos, livros, livros, folhas soltas,
carimbando, pondo selos, bocejando, bocejando, bocejando.

Manuel da Fonseca, Obra poética

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